quinta-feira, 26 de junho de 2008

A Biblioteca

A pedidos da Carol...
(não, eu não esqueci! Espero nao lhe desapontar...)

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O crepúsculo noturno iluminava, ainda que com a ajuda das luzes dos postes ofuscadas pelo voar ébrio dos cupins, a pequena porta de madeira da entrada do prédio.

O ambiente que, dentro de sua normalidade deveria ser inquietantemente silencioso, produzia um murmurinho incomum. Aliado a isso, o ranger dos tacos do piso polido e brilhoso do andar térreo, aglutinado ainda ao som sequioso dos livros folheados displicentemente por seus vorazes e desleixados leitores, que brincavam de estudar sobre pesadas mesas de metro, furavam-me os tímpanos sem pedir licença.

Aquele lugar, que por si só já transmite a idéia clássica de recanto intelectual dos sábios gênios insanos boêmios, refugava a idéia de biblioteca de um mundo contemporâneo.

Fria. Escura. Sua verticalidade era um túnel sem fim nem brilho no remate. Girando o pescoço via os janelões fitando-me, as grandes placas de vidro indagando-me se permaneceria parado naquele patamar. Olhei para cima e notei as estantes me convidando para desbravá-las, implorando que as desvirginasse, como lolitas holandesas em um pub nada familiar de Amsterdã.

Subi a escada de madeira vestida por seu pano vermelho aveludado. Entre uma parede de tijolos, senti o cheiro frio instalar-se nas traquéias e um gosto de barro me fez salivar. Deveria ser este o primeiro sentimento daqueles que ousam experimentar um livro antigo.

O piso de madeira lustrosa deu lugar a um carpete de plástico-bolha encorpado. A passada seca e bem humorada foi tomada por uma batida opaca. Meu nariz coçava. Rinite.

As estantes grudadas meio de lado, como que cansadas, nas enormes paredes de vigas transmitiam a idéia de esconderem um segredo antigo: a impressão era de que o mais novo dos livros fora lido por Carlota Joaquina de Bourbon para Pedro quando este ainda era uma criança.

Tocando um a um, sentia a viscosidade das capas grossas de couro; o pó batendo asas e pousando, pareceu-me de propósito, em minhas ventas largas.Nada estava ali por acaso. Todos retratavam um fato, uma história. Uma epopéia passada que há muito foi contada através de sábias linhas tortas.

Era como se eles falassem, suas bordas eram bocas desdentadas que suplicavam para serem abertas.

Senti frio. Um arrepio. Peguei-o. Abri-o. Uma nuvem de pó surgiu. Espirrei. Coisas que só uma biblioteca pode fazer.

Um comentário:

Carol Giacon disse...

Em um semestre que tivemos mais trabalhos do que podemos contar vem você e faz uma descrição dessas!
Posso dizer? Adorei! Nunca fui uma boa aluna de redação, mas aprecio bastante quem escreve bem! Valeu a espera para ler!

Semestre que vem quero mais destes pra ler, ok?